pág. 16 # A lenda das águas-vivas
Atravessar tempo e espaço é como atravessar paredes. Se antes as águas-vivas eram responsáveis por atravessar cavernas e esculpir montanhas, agora elas reconstroem cidades inteiras. Ao seu modo de ver e sentir. As donas desconhecem ritmo e seguem seu próprio percurso a fim de fomentar o movimento.
Ninguém segura a vida das águas com as mãos. Ninguém fica no mesmo lugar depois de se encontrar com uma água-viva. Nunca se viu um desenho tão particular.
Além da troca de calor causada diretamente entre membranas, as águas causam tormenta entre as paredes. E o que antes era massa e cimento, agora vira topografia sensível. O padrão de enrugamento funciona como uma espécie de sistema de drenagem, mas a casca que recobre não permanecerá fixa, a menos que você não tenha capacidade de mudança. As águas escorrem na troca da pele e nada pode ser feito, a não ser se descascar por inteiro e procurar sua próxima casca.
Quando o bando das águas penetram na pele do mundo, perde-se a consciência de começo e fim. Causa ainda um certo incomodo particular, desses que se sente nas costas, na altura rochosa dos ombros, podendo virar segunda pele e inundar sonhos também. Ninguém segura água na mão sem se inundar.
Depois que passam as águas, seres se alimentam projetados nelas. De uma lupa é possível ver o olhar microscópico carregado de inconsistências. Neste ponto, já não era de se espantar que as águas-vivas teriam uma terceira dimensão: a do peso que carregam, pois fazem boiar sociedades inteiras. Mesmo que a pintura seja feita de gente, nunca será permitido esquecer, porque sempre haverá alguém que olha onde correm as águas-vivas.
Villa Epecuén, uma cidade debaixo d’água
Se anteriormente escrevi sobre a vaquinha e meu movimento em direção à minha primeira residência artística, hoje escolhi escrever um pouco sobre o lugar que recebe a residência: Villa Epecuén, um balneário localizado a cerca de 520km da cidade de Buenos Aires.
Villa Epécuen foi construída a partir de 1920 como uma cidade turística para receber os visitantes que buscavam as águas consideradas terapêuticas do lago Epecuén, um local com alta concentração de sal, comparado a salinidade do Mar Morto.
A lenda conta que, no ano de 1985, o excesso de chuvas combinado com irregularidades da obra pública para o represamento das águas, foi determinante para romper os diques e proteções que cercavam a lagoa, fazendo com que a cidade fosse evacuada as pressas. Em cerca de quinze dias o nível da água subiu acelerado e (quase) tudo ficou submerso.
Somente 20 anos depois, o nível da água começou a baixar, e o que antes era um balneário turístico que recebia visitantes no verão tornou-se uma cidade fossilizada pelas águas do tempo. A área foi declarada Patrimônio Histórico pela magnitude dos acontecimentos e por abrigar restos de edificações do arquiteto Francisco Salamone, como o Matadouro e outras construções do período modernista na Argentina.
Uma das recompensas da vaquinha, e talvez a que mais me deixa animada, é poder fazer um diário de bordo contando a experiência da residência semelhante ao que já venho praticando aqui na newsletter. Fica aqui o convite caso você queira me ajudar a navegar esse barco rumo a Villa Epecuén:
Se você não gosta de cadastros ou plataformas de pagamento pode vir de PIX que está valendo! Só responder esse e-mail que te ajudo.
A vaquinha vai até 31/03, porque a residência já acontece em abril, durante todo o mês.
Semana que vem saí uma nova newsletter trazendo um pouco do projeto de instalação que inscrevi para participar da residência.
Se quiser saber mais sobre a vaquinha, conheça aqui.
Visite meu site.
Me siga no instagram.
Conheça meu portfólio.